Vamos falar um pouco sobre como é desenvolver cosméticos e como o design pode ajudar a criar produtos de beleza com embalagens mais sustentáveis.
As embalagens e os oceanos de plástico
Você sabe como se faz cosméticos? Deve ser simples, afinal de contas existem tantos no mercado, não é? Mas se é tão simples assim, por que vários dos cremes hidratantes que compramos não deixam nossa pele suave, e as vezes até nos dão alergia? Por que alguns xampus parecem deixar nossos cabelos mais secos? E olhando pelo lado ambiental, por que tantas toneladas de plástico das embalagens acabam nos rios e nos mares? Já parou para pensar?
Por causa do choque causado pelas imagens de montanhas de plástico boiando nos oceanos, embalagens recebem muita atenção quando se fala sobre sustentabilidade. Isso faz com que indústrias de bens de consumo invistam em tornar seus produtos mais recicláveis. Grande parte dessas indústrias são do segmento de alimentos e bebidas. Podemos perceber essa realidade pelo fato de que no Brasil, por exemplo, os materais mais reciclados são o alumínio e o PET. Nos Estados Unidos, o mesmo acontece com o PET e o PEAD. Esses são os materiais mais utilizados na indústria de bebidas nesses respectivos países. A indústria de cosméticos também está progredindo, mas ainda trabalha em menor proporção com materiais reciclados, recicláveis e de fontes renováveis. O setor tem investido em desenvolver formulações mais naturais, mas pouca atenção tem sido prestada na pegada ambiental de suas embalagens. Será que isso não pode
mudar?
O que está rolando na indústria de cosméticos
Pode e está mudando, ainda bem. Com o passar do tempo, mais e mais empresas percebem que colocar uma formulação já conhecida com uma nova fragrância em uma embalagem bonita é fácil. Mas desenvolver cosméticos de qualidade e sustentáveis dá bastante trabalho. O processo de criação leva em geral 3, 4, 5 anos… E por que tanto tempo? Porque para criar uma linha de novos produtos são envolvidas dezenas de fornecedores de matérias-primas e de embalagens. Além disso, muitas coisas precisam ser levadas em consideração nesse processo, desde a estabilidade e qualidade da formula até o custo e o impacto ambiental de sua fabricação e da embalagem.
Nos últimos anos, vimos surgir marcas que se preocupam em aplicar tecnologias para redução do impacto ambiental de seus produtos. Um bom exemplo é a marca Taiwanesa O’Right. Em 2013 a O’Right lançou uma garrafa de shampoo 100% biodegradável, que ao se decompor libera
uma semente que irá germinar uma planta acácia.
Outra empresa estrangeira pioneira no desenvolvimento de embalagens mais verdes é a Aveda. Parte do grupo Estée Lauder, a Aveda foi uma das primeiras empresas de cosméticos no mundo a receber a certificação Cradle-to-Cradle, que avalia o ciclo de vida do produto e da embalagem.
No Brasil, a Harah Cosmetics é um exemplo de marca de cosméticos que investe em sustentabilidade, desenvolvendo produtos que buscam o equilíbrio entre inovação e ingredientes naturais. Todos os produtos são avaliados dermatologicamente e não são testados em animais, garantido pelo selo Cruelty Free. Desde a criação da marca, sua prioridade era produzir cosméticos com o menor impacto ambiental possível. Para isso, além de escolher embalagens com materiais facilmente reciclados, a Harah fez uma parceria com o selo eureciclo.
O selo eureciclo calcula o passivo ambiental das embalagens dos produtos comercializados pela marca. Esta, por sua vez, remunera as cooperativas de reciclagem para retirar do ambiente o equivalente à massa de resíduos que ela gerou. Graças ao engajamento de empresas como a Harah, o selo eureciclo conseguiu alcançar diversos resultados: aumentar em até 35% a renda de trabalhadores na cadeia de reciclagem, garantir a formalização de dezenas de recicladores e rastrear milhares de toneladas de resíduos sendo oficialmente reciclados. O resultado do carinho da Harah ao desenvolver produtos é ser reconhecida como a primeira empresa de beleza do Brasil a ter o equivalente a 100% dos resíduos sólidos de suas embalagens reciclados.
Design e desenvolvimento
Mais do que conhecimento técnico, criar produtos mais sustentáveis e que não coloquem a saúde de quem usa em risco requer design responsável desde o começo. Ainda na fase inicial de desenvolvimento deve-se ter a criação de embalagens mais sustentáveis como uma prioridade. Passando pela escolha das resinas plásticas e até mesmo do tipo de decoração, as embalagens desenvolvidas devem ser recicláveis. Ou seja, elas devem ser compostas apenas de um material, como papel, vidro ou apenas de um tipo de plástico, como o PEAD ou o PET. Além disso, precisam ser feitas com materiais que sejam amplamente coletados por cooperativas de reciclagem e facilmente processados nas usinas de reciclagem locais. Outra opção é a utilização de material reciclado na matéria prima da embalagem ou de material proveniente de fontes renováveis, como o plástico de cana-de-açúcar.
Mas sustentabilidade não significa apenas reciclabilidade e materiais verdes. Questões envolvendo a maneira como o produto será usado precisam fazer parte dos critérios de avaliação do design para evitar o desperdício e o uso inadequado, que também contribuem com os índices de sustentabilidade do produto. Alguns questionamentos durante a fase de design podem ser, por exemplo:
• Como o novo produto pode solucionar um problema atual de melhor maneira do que os produtos que já existem?
• Que benefício o produto traz para seus usuários e para o planeta?
• Como e onde o produto é usado? Qual a quantidade usada em cada aplicação?
• Como o produto será transportado? A embalagem será resistente para suportar o transporte durante a distribuição?
• As embalagens serão bonitas o suficiente para chamar a atenção das pessoas nas prateleiras dos supermercados e drogarias? Ou os produtos ficarão expostos por meses até serem comprados, com risco de ter seu prazo de validade expirado?
Esses são apenas alguns dos tópicos abordados durante o desenvolvimento de um cosmético. Ao final, a embalagem ainda precisa ter um custo que que não torne a produção inviável.
Para organizar essas necessidades, diversas ferramentas de design podem ser aplicadas. Pesquisas de mercado, benchmarking de competidores, mood boards para a criação de conceitos, definição de elementos de design, seleção de critérios críticos de qualidade, testes de protótipos com potenciais usuários… A lista é longa. Atualmente, algumas empresas do setor de beleza estão utilizando metodologias de desenvolvimento de produtos como o Design Thinking, que é popular nas industrias de software e eletrônicos. Junte tudo isso aos inúmeros testes de laboratório para a formulação e para a resistência física e química da embalagem, e você consegue entender porque se demora anos para desenvolver cosméticos de qualidade.
O que (mais) você pode fazer?
Agora que você sabe um pouco mais sobre como produtos de higiene e de beleza são feitos, o que você pode fazer para colaborar? Você já separa seus produtos na hora da reciclagem? Se sim, excelente! Para ajudar ainda mais você também pode procurar produtos de marcas certificadas. Ao comprar produtos de marcas com o selo eureciclo, você dá um passo além para diminuir o impacto ambiental dos produtos que você consome. Com isso, faz sua parte para manter plásticos circulando nas cadeias de produção e bem longe dos mares.
Texto por Eliziane Siqueira – Consultora de Desenvolvimento de Embalagens